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Posts Tagged ‘ensaio sobre a cegueira’

Diz-se a um cego, Estás livre, abre-se-lhe a porta que o separava do mundo, Vai, estás livre, tornamos a dizer-lhe, e ele não vai, ficou ali parado no meio da rua, ele e os outros, estão assustados, não sabem para onde ir, é que não há comparação entre viver num labirinto racional, como é, por definição, um manicómio, e aventurar-se, sem mão de guia nem trela de cão, no labirinto dementado da cidade, onde a memória para nada servirá, pois apenas será capaz de mostrar a imagem dos lugares e não os caminhos para lá chegar. Postados diante do edifício que já arde de uma ponta à outra, os cegos sentem na cara as ondas vivas do calor do incêndio, recebem-nas como algo que de certo modo os resguarda, tal como as paredes tinham sido antes, ao mesmo tempo, prisão e segurança. Mantêm-se juntos, apertados uns contra os outros, como um rebanho, nenhum deles quer ser a ovelha perdida porque de antemão sabem que nenhum pastor os irá procurar.

English version:

Say to a blind man, you’re free, open the door that was separating him from the world, Go, you are free, we tell him once more, and he does not go, he has remained motionless there in the middle of the road, he and the others, they are terrified, they do not know where to go, the fact is that there is no comparison between living in a rational labyrinth, which is, by definition, a
mental asylum and venturing forth, without a guiding hand or a dog-leash, into the demented labyrinth of the city, where memory will serve no purpose, for it will merely be able to recall the images of places but not the paths whereby we might get there. Standing in front of the building which is already ablaze from end to end, the blind inmates can feel the living waves of heat from the fire on their faces, they receive them as something which in a way protects them, just as the walls did before, prison and refuge at once. They stay together, pressed up against each other, like a flock, no one there wants to be the lost sheep, for they know that no shepherd will come looking for them.

. José Saramago

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A culpa foi minha. chorava ela, e era verdade, não se podia negar mas também é certo, se isso lhe serve de consolação, que se antes de cada acto nosso nos puséssemos a prever todas as consequências dele a pensar nela a sério. primeiro as imediatas. depois as prováveis, depois as possíveis, depois as inimagináveis, não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar.

.José Saramago em Ensaio sobre a Cegueira

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Ninguém faz perguntas, o médico só disse, Se eu voltar a ter olhos, olharei verdadeiramente os olhos dos outros, como se estivesse a ver-lhes a alma, A alma, perguntou o velho da venda preta, Ou o espírito, o nome pouco importa, foi então que, surpreendentemente, se tivermos em conta que se trata de pessoa que não passou por estudos adiantados, a rapariga dos óculos escuros disse, Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos.

.José Saramago in Ensaio sobre a Cegueira

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Agora não há outra música senão a das palavras, e essas, sobretudo as que estão nos livros, são discretas, ainda que a curiosidade trouxesse a escutar à porta alguém do prédio, não ouviria mais do que um murmúrio solitário, este longo fio de som que poderá infinitamente prolongar-se, porque os livros do mundo, todos juntos, são como dizem que é o universo, infinitos.

.José Saramago

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Há ocasiões em que as palavras não servem de nada, quem me dera a mim poder também chorar, dizer tudo com lágrimas, não ter de falar para ser entendida.

.José Saramago

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Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos.

. José Saramago

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Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, cegos que vêem. Cegos que, vendo, não vêem.

. José Saramago in Ensaio sobre a Cegueira .

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